domingo, 11 de dezembro de 2011

Constitucionalismo, democracia e Federação: a divisão do Pará

Muitos devem ter acompanhado as questões levantadas sobre a divisão, ou não, do Estado do Pará. Para nós que pretendemos pensar o direito constitucional e a democracia em uma relação de implicação mútua, fica a questão: qual federação pretendemos construir? Como dividir os recursos em um país tão grande e desigual? É o nosso atual modelo de Federação o melhor e mais adequado para os problemas que nós brasileiros temos que enfrentar? A questão da divisão (ou não) do Estado do Pará, recoloca esse tema clássico na agenda. Seguem alguns textos (os dois primeiros publicados na Folha de São Paulo de sábado) sobre o assunto, bem como o resultado recém proclamado pela não divisão do Estado em três (Carajás, Tapajós e Pará):



FLEXA RIBEIRO

TENDÊNCIAS/DEBATES

O Pará deve ser dividido em três Estados?

NÃO

Estado precisa ser reconhecido pela União

Amanhã, dia 11, os paraenses vão dar um exemplo ao Brasil de exercício democrático. O país acompanhará o desfecho do plebiscito que dará voz à população paraense se esta deseja ou não a divisão do Estado em três, para o surgimento de Tapajós e Carajás.

O exemplo paraense deve ser compreendido pelos brasileiros. E, principalmente, pelo governo brasileiro. Propostas de divisão territorial não são novas. Desde a promulgação da Constituição, em 1988, surgiram cerca de 20 projetos para criação de novos Estados, nas cinco regiões do País.

Todas elas possuem, em sua principal justificativa, a necessidade de atender melhor a população em serviços básicos, como saúde, educação, segurança e infraestrutura. O discurso separatista ganhou força ao preencher o vazio deixado pelo Estado brasileiro.

A novidade é o processo de um plebiscito. E o Pará enfrentou o tema sem medo. No dia seguinte ao plebiscito, mostrará maturidade ao levantar novas bandeiras, em conjunto e com mais força. O plebiscito fez com que o Brasil ouvisse a voz do Pará. Uma voz que dirá mais que um monossilábico "não".

O encaminhamento é o de que o Pará não precisa ser dividido. Precisa, com urgência, ser reconhecido pela União. União que representa todos os entes da Federação. Porém, cada vez mais, tais entes não se sentem representados por conta de um pacto federativo injusto.

Infelizmente, é comprovada a falta de vontade política da União em cumprir a determinação constitucional de tratar de forma desigual os desiguais, com a ausência de políticas públicas eficientes e integradoras. De acordo com os valores pagos pela execução da Lei Orçamentária de 2010, a União investiu R$1,4 trilhão em todo o país.

Desse montante, apenas irrisório 1,1% foi destinado para os nove Estados da Amazônia Legal. A criação de novos Estados mudaria isso? Certamente não.

Com o plebiscito, o Pará evidenciou o sentimento de abandono que é comum a outras áreas do país que buscam a emancipação. Porém, em vez de apontar o dedo, o Brasil deve estender a mão a essas regiões e compreender que o separatismo não surge só pela intenção de lideranças políticas, mas pela falta de apoio do governo federal aos Estados.

Certamente, quem votar no "não" é, sim, solidário a Tapajós e Carajás. Portanto, o "não" à divisão é também um sim à urgente necessidade de rever o pacto federativo brasileiro. Isso precisa ser encarado pelo governo federal. Do contrário, o exemplo pacífico e democrático do Pará pode ser precursor de capítulos mais traumáticos à história do Brasil -o que não queremos.

Que o plebiscito seja um marco na história do país, fazendo com que a União reconheça as suas obrigações. Entre elas, a regulamentação da Lei Kandir, que penaliza os Estados exportadores -como o Pará- com perda aproximada de R$1,5 bilhão/ano. Essa, sim, deve ser a bandeira de todos os paraenses. Uma bandeira que exige de volta aquilo que é de direito do nosso povo e que nos foi tirado pela União.

É, por fim, um marco para que o pacto federativo não seja mais um mecanismo perverso que promove o rapto das riquezas dos Estados.

A União deve compartilhar as diferentes contribuições federais entre Estados e municípios, garantindo recursos suficientes para que possam atender satisfatoriamente a demanda crescente de serviços públicos da população.

O plebiscito deixa claro que precisamos resolver essas questões, comuns a todos os Estados. A única forma de superar tais desafios é encarar esses e outros pontos ainda intocados pela União. E não por meio de simples redefinições de limites geográficos.

FLEXA RIBEIRO é senador pelo PSDB-PA, ouvidor-geral do Senado, vice-presidente da Executiva Nacional do PSDB e vice-líder do PSDB no Senado.




EDIVALDO BERNARDO

TENDÊNCIAS/DEBATES

O Pará deve ser dividido em três Estados?

SIM

Benefícios para todos

Estamos cientes de que a redivisão político-administrativa do Pará resultará em benefícios tanto para o Pará quanto para Carajás e Tapajós. A verdade é que o Pará tem muitas dificuldades e não consegue levar desenvolvimento para milhões de seus habitantes.

Pois, sendo um Estado gigante, com população grande, regiões abandonadas e muitas carências, tem problemas que o governo paraense não pode solucionar, porque sua arrecadação é muito baixa.

Dessa maneira, o governo paraense não faz os investimentos necessários no Estado porque não arrecada o suficiente e não arrecada o suficiente porque não faz os investimentos necessários.

Com a divisão do atual território paraense, o novo Pará continuará recebendo seus recursos, enquanto as regiões de Carajás e Tapajós vão passar a receber recursos federais que antes não recebiam.

Essas regiões terão direito a cota do Fundo de Participação dos Estados (FPE), transferidas pelo governo federal, que somarão R$ 3,3 bilhões ao ano. Esse dinheiro é mais que o dobro de tudo o que o governo do Pará gastou nessas regiões no ano de 2010.

Por sua vez, o governo do Pará vai reduzir grande parte de suas despesas. Isso porque vai transferir para os novos Estados o ônus de administrar 1 milhão de km², 66 municípios, 2,7 milhões dos seus atuais habitantes e cerca de 5.000 servidores estaduais.

Vai também deixar de gastar R$ 1,5 bilhão, que foi o que gastou nessas regiões em 2010. Sua receita por habitante vai aumentar, já que sua população será reduzida em 36%, mas suas receitas não serão reduzidas na mesma proporção.

Por isso, seu FPE per capita irá aumentar em 35% e o ICMS per capita em 3%. Além disso, a área do novo Pará será ainda maior que a de 12 Estados do Brasil, e quatro vezes maior que o Rio de Janeiro, o segundo mais rico do país.

Desenvolvimento é ter uma população com altos índices de educação, economia com moderna industrialização, e não tamanho de território. O Japão é um país pequeno e rico. Investiu na educação do seu povo. Modernizou a indústria. Os Estados Unidos são um país grande e rico, também muito industrializado, e seu povo dispõe de excelentes escolas e universidades. Abaetetuba é maior que a cidade de São Paulo (com R$ 357 bilhões de riqueza em 2008), que por sua vez é mais rica que todos os sete Estados da região Norte do Brasil (com R$ 154 bilhões).

O Pará ficará com toda a orla marítima do Estado, que, além de ser fonte de turismo, abriga portos de exportação e tem indícios de ocorrência de petróleo e gás.

Estudos aprofundados de finanças públicas indicam que os três terão mais desenvolvimento. Assim aconteceu com São Paulo e Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Goiás e Tocantins. Todos prosperaram. Vejam: o Pará recebeu R$ 2,9 bilhões do FPE, transferido pelo governo federal, em 2010.

Com a criação de Carajás e Tapajós, haverá aumento da receita regional, resultando num FPE para o atual território do Pará da ordem de R$ 5,9 bilhões. Onde existe apenas um FPE, passarão a existir três.

O novo Pará continuará recebendo seus recursos, e os novos Estados de Carajás e Tapajós passarão a receber recursos do governo federal que antes não recebiam.

Portanto, se a divisão do Pará é boa para todos, não devemos ser contra! Sim, haveremos de ver nosso sonho se tornar realidade. As populações que habitam as regiões de Carajás e Tapajós hão de conquistar o direito de governar seus próprios destinos. Afinal, quem possui de fato deve possuir de direito.

EDIVALDO BERNARDO, doutor em história e literatura (Universidade de León, Espanha), é professor da Universidade Federal do Oeste do Pará.



Governador do Pará festeja resultado de plebiscito e critica pacto federativo

Sandra Rocha
Do UOL Notícias, em Belém (PA)

O governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), comemorou o resultado do plebiscito, mas disse que a consulta é um recado aos demais Estados que se contentam com o modelo federativo atual. “Amanhã, pode ser você”, disse.

Jatene fala em desafios após votação

Jatene deu uma entrevista coletiva logo após o anúncio do resultado do plebiscito, em que considerou legítimo o desejo dos que querem mais atenção do Estado. O remédio adotado é que não foi aprovado.

O governador disse que se o governo dividir o orçamento em partes iguais para as regiões, a situação continuará ruim porque o maior problema do Estado é financeiro.

"A insuficiência de recursos é determinante. Parece choro de quem quer dinheiro, mas não é isso", disse, ao apontar as perdas como a gerada pelo modelo exportador adotado no Brasil.O Pará, por exemplo, deixou de arrecadar R$ 1,5 bilhão com a exportação de minérios por causa da desoneração determinada pela Lei Kandir. Hoje, recebe apenas R$ 260 milhões de compensação.

Para o governador, o plebiscito abriu uma vitrine e agora cabe ao Pará puxar a discussão nacional sobre mudanças na forma como as riquezas do país são repartidas.

“É preciso que tenhamos um pacto para recolocar o Pará na discussão nacional. Espero que o que ficou restrito ao Estado do Pará se torne nacional. Teremos um ambiente mais favorável”, disse

http://noticias.uol.com.br/politica/2011/12/11/governador-do-para-festeja-resultado-de-plebiscito-e-critica-pacto-federativo.jhtm


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