Carta de Curitiba
Sobrevivemos.
O diagnóstico desses quatro dias que nos uniram aqui, na marcada Curitiba, é a
constatação de que sobrevivemos.
A
referência não é feita no sentido da intensidade intelectual dos quatro dias profundamente
vibrantes de discussão acadêmica conformadora da tensão dialética e produtiva
do direito: foram 12 painéis, com 17 professores, sendo destes 6 estrangeiros,
15 grupos de trabalho na qual mais de 300 trabalhos foram debatidos; tudo sob a
bem orquestrada pela batuta dos maestros Professores Doutores Vera
Karam de Chueiri, Katya Kozicki, Thomas Bustamante e Marcelo Cattoni.
Também
não é feita, a referência à sobrevivência, como alusão às dificuldades das
múltiplas restrições – de recursos, disponibilidades, materiais, pessoal,
dentre outros – que cercam o ambiente educacional superior no Brasil. O cenário
de crise vulnera diretamente a tutela dos direitos sociais e das prestações
estatais e atinge o âmago da produção e pesquisa do direito que se localizam nos
espaços públicos. Aqui nossa gratidão a todos e todas que foram empáticos e
solidários de nosso projeto e o construíram a muitas mãos.
A
sobrevivência aqui constada é da constituição – esta com c minúsculo,
localizada, desidealizada e encarnada na sua radicalidade. O direito e
filosofia constitucional sobrevivem, neste cenário turvo que conforma a história
do presente.
A
partir de diversos ângulos, marcos teóricos e abordagens, o futuro do estado de
direito e sua capacidade de fazer frente aos desafios que se colocam foi
colocado no centro do palco. Desafios que já não cabem mais na fronteira dos
espaços, tempos, sujeitos e armaduras teóricas para os quais foram inicialmente
modelados. Todos unidos nas diferenças pelo desígnio de pensar a reconstrução
da democracia e de seu aspecto social ante as desigualdades e injustiças que a
vulneram.
A
constituição, ainda que vulnerada, persiste, sobrevive. Esta constituição que é
muito mais do que a força normativa do seu texto – como lembrou o Professor de
todos nós, Menelick de Carvalho Netto, justamente homenageado no Congresso – que
se projeta para o futuro como luta e como promessa.
Estamos
diante de disputas pelos sentidos da constituição, do Estado de direito e da
democracia e temos que resistir e transgredir. Resistir à visão constitucional
redutora de pluralidade, complexidade, crises e conflitos que a aprisionam em
espaços, tempos e sujeitos que não a contêm. Transgredir à normatividade é insistir
na promessa contida na constituição.
Resistência,
transgressão, luta, crença e promessa são de modo ambivalente e ponto de
chegada que nos reuniu até aqui na primavera chuvosa curitibana. Marcam também
a partida com o desígnio que frutifiquem nas caminhadas coletivas e individuais,
sincrônicas e diacrônicas, daqueles que saem muito diversos do que aqui
chegaram.
Fique
aqui o convite do porvir nas palavras da poetisa paranaense Helena Kolody:
Completou uma jornada.
Chegar é cair na inércia de um ponto final.
Na euforia da chegada, há um convite irrecusável
para uma nova partida.
Chegar é cair na inércia de um ponto final.
Na euforia da chegada, há um convite irrecusável
para uma nova partida.